Os teus camaradinhas te respeitam?

Sabe quando você se acha tão esperto e sente que tudo é possível? Isso aconteceu ontem quando eu e mais meus amigos chegamos em Florianópolis e percebemos que havíamos esquecido a chave do apartamento onde iríamos ficar. Você faz uma longa viagem e quando chega no fabuloso destino no donut for you? O primeiro pensamento ficou em torno do quanto aquela atitude tinha sido um grande vacilo, seguida por diversas exclamações "mas que bad, amiguinhos, e agora?". Foi mais ou menos por aí que eu coloquei a minha genialidade para funcionar. "Alguém tem um grampo de cabelo, a gente pode tentar abrir a porta com, sei lá, dois grampos". Esse é o problema de seus amigos te acharem inteligente. Você pode falar as maiores merdas da história que eles vão considerar como uma hipótese válida. E assim foi. Meu amigo Victor começou a cavocar a fechadura com dois grampos que. por ventura, a namorada dele tinha na bolsa. Enquanto isso eu proferia palavras de incentivo e olhava para a fechadura com uma expressão intrigada. Quando vimos que não obteríamos sucesso eu tive outra genial ideia. "Mas é claro, nós estamos fazendo errado! Vamos pegar o laptop e ver um vídeo no YouTube explicando como se arromba uma fechadura", mas uma vez fui aclamada pelo excelente plano.

 

 Depois de assistir a essa magnífica aula nos sentimos invencíveis, tudo era possível, desde que houvesse perseverança e otimismo. Nós tínhamos tudo. Não sei exatamente em qual hora desistimos e ligamos para o chaveiro, mas naquele momento, em que estávamos sentados no chão do corredor do prédio, com nossos computadores e celulares bolando estratégias para a vitória, foi mágico. Nunca nos sentimos tão unidos e crentes no amanhã. Mesmo quando chamamos o chaveiro e ficamos cinquenta reais mais pobres, não sentimos o gosto acre do fracasso, pois sabíamos que ser jovem é ser persistente.

Agora vou ser sentimental sem o sarcasmo do parágrafo anterior

Mas Taísa, o que você foi fazer em Florianópolis? Vocês podem querer saber. Mas eu não vou contar porque é segredo. Mentira, quero que vocês pensem que a minha vida é interessante e cheia de mistérios, mas nem é. A grande verdade é que vim trazer a minha irmã até o aeroporto da nobre capital do meu estado. Ela vai ficar um mês longe, e eu supostamente ficaria um mês sozinha em casa. Lembram que postei que minha mãe ficaria quarenta dias na minha casa? Aparentemente a reciproca é verdadeira e ela também não gosta de mim. Sei lá, sempre achei que mães amassem seus filhos independente de qualquer coisa, mas enfim; ela foi embora com o saco aparentemente cheio. Entretanto, lavou minhas roupas e decidi manter um pacto de não agressão devido a tamanha camaradagem. Resumindo a razão do assunto: meu pai agora virá passar uma temporada na minha casa.
Mas Taísa, por quê seus familiares não deixam você ficar sozinha em casa? Você deve mais uma vez estar se perguntando. Afinal, eu tenho 23 anos, um microondas e diversos víveres na minha dispensa. Acredita que a minha família acha que posso cometer su*cídio a qualquer momento? Que eles se telefonam entre si e analisam cada vez que eu pego um livro da Virginia Woolf na mão? Que piadas envolvendo gás de cozinha não são engraçadas sob o meu teto?

E eu sou uma pessoa tão absurdamente sensível a vida e suas manifestações. Perco horas "vendo a beleza das coisas", mas sempre estou séria e concentrada nos meus pensamentos. Não demonstro minhas emoções, e de alguma forma, dou a entender que não me importo com nada. Todo dia eu levanto pela manhã e penso em como eu me sinto confortável e satisfeita. Eu decido me levantar e me deparar com diversas situações emocionantes, como os gatos do vizinho esparramados sob o sol do inverno ou com dois garotos de quatro anos se abraçando no pátio da escola que fica perto do meu trabalho. Sim, é um cliché do cacete. Mas eu não sou uma jovem com aquela mentalidade "eu já vi de tudo na vida". Amigos, eu nunca vi nada, e eu jamais poderei ver tudo.

Não sou o Werther, mas sim o Meister e cada dia eu aprendo mais e exercito as minhas potencialidades. Como é bom ver o quanto tenho amadurecido e avaliado as minhas relações com os outros. Talvez seja por isso que me seja tão difícil postar nesse blog como eu fazia antes. Não reclamo mais das bobagens com as quais eu costumava me importar, não julgo mais a maneira com que os outros levam suas vidas. Não curto mais chamar a galerinha de idiota, pois talvez a idiota seja eu, e que rotular as pessoas em categorias seja a maior limitação da humanidade.

E o meu objetivo de vida, sim queridos pais, de vida, é me limitar cada vez menos e absorver cada dia mais. E viver pode ser maravilhoso, mesmo quando você percebe isso vendo um simples vídeo de arrombamento no YouTube com seus amigos. Não sei, mas não preciso de muito mais que isso. E espero nunca precisar.

4 comentários:

desconhecido autor disse...

Mas uma alma salva pro rebanho de Jeová. Senti um vazio repentino. Agora estou divagando nos comentários. Complicado a vida parece ser, mas é aquela matemática bonita do futebol: tem sempre alguém numa pior maior ainda. Então levanta-te e anda no melhor estilo Lazarus e siga à passos firme, deixando-se estar distraída quando convir.


Loucura isso.

Ari Denisson disse...

Interessante. Otimista. Mas não é otimismo ingênuo de fã de banda colorida. Parece-me justamente uma resposta a esse clima de pretensão vlogueira.

Tendências cansam. A atual é a de fazer um vlog e bancar o mal-humorado, metralhando todas as banalidades da sociedade. Desculpe se eu estiver exagerando, mas aqui deve estar um esboço de desafio a essa chatice epidêmica.

borges disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
borges disse...

olha, não sei quanto tempo fiquei sem vir aqui, mas parece que uma outra Taísa saiu dai de dentro!?
ahuha.
Seja como for, seu texto carrega mais do que clichés, e isso é bom. Texto bom pra quem carrega o otimismo consigo, e melhor ainda para os que consideram sexy, cool ou interessante ser pessimista.

O mundo é um negócio tão grande né? Não só estrelas, galáxias outras, e afins. O mundo nosso, o mais achegado.

Acho que viver é um trem 'pouco', um trem pequeno, quanto mais pudermos dilatar o sentido desse ato, melhor.